ATARÁXIA | Espaço Moinho
Piso 0
Inside the Infinite Cylinder, 2020
350 x 250 x 250 cm
fita têxtil e cola
Vídeo 4,01 min
modelo: Sílvia Chiola
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O corpo e as linhas, interação. 2020
Video-performativo 4,59min
Piso 1
(objectos)
Coleção Circunferências: do circulo à elipse
Não são circunferências perfeitas, pois para isso precisavam de ter todos os raios
com o mesmo comprimento, onde os pontos seriam todos equidistantes entre si.
Mas são circunferências porque se tratam de linhas curvas que se fecham sobre si
mesmas e consegue-se traçar uma linha divisória em cada peça, que as separe e
crie duas semicircunferências, mais especificamente as elipses.
(desenhos)
s/ titulo (estudos da linha curva que se fecha em si própria)
Piso 2
Um pequeno (infinite cylinder) momento , 2020
180x 100 x 60cm
Tubo cartão, fio têxtil, foco de luz, ventoinha, gravação áudio e coluna.
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Objecto vivo- Cilindro manuseável, 2020
Vídeo-performativo 6,31 min
Um olhar para dentro, um olhar para fora e um olhar refletivo sobre a forma.
A sua forma redonda despoletou todo um trabalho à volta do que é circular, de forma redonda, de forma infinda e cíclica.
cíclico como a mulher,
curvo como um gesto,
redondo como um ovo,
mas contínuo como uma linha que se projeta no espaço.
A mais continua de todas as formas é uma exposição que apresenta alguns passos desta viagem, de observar o moinho, a sua (des)conexão com o lugar onde se insere, a estabilidade da forma arredondada ascendente e a extensão da peça como se de um prolongamento do corpo (fazedor) se tratasse.
As instalações apresentadas no ESPAÇO MOINHO, resultantes de uma residência artística ATARÁXIA com a duração de um mês, propõem um olhar atento sobre a forma e o espaço. São apresentados alguns resultados práticos multidisciplinares, isto é, das diferentes disciplinas com que trabalho e que foram exploradas durante este tempo-espaço. Algumas destas disciplinas são mais utilizadas para estudo, em processos de segmentação, síntese e desbloqueio da forma tentando sempre simplificá-la (como: desenhos, textos, esboços, rabiscos, até alguns vídeos mais experimentais), neste caso fez sentido trazer para a exposição o percurso, como algo igualmente contínuo e não finito.
O foco está na forma cilíndrica (como a mais contínua de todas as formas) e por consequência nas restantes formas que a envolvem e que lhes estão subjacentes, explorando e repensando a forma redonda e a linha (pertencentes ao cilindro).
Fixa e flexível ao mesmo tempo, revela-se a “peça mãe” que ocupa neste espaço a relação entre fazedor-peça-observador. Esta ao ser desenhada em função do espaço que a alberga, realça-o, propondo uma realidade subtilmente delineada entre o dentro e o fora, que mais do que ser observada, se propõe habitada e experienciada pelo espectador.
A sua estrutura, assume-se assim como uma cápsula que enquanto dispositivo quase translúcido, permite-nos observar a ascensão da forma e emerge-nos numa sensação de cadência, enquanto um vídeo nos aponta para um olhar no exterior e nos fala de horizontalidade – como uma janela.
A forma volumosa geométrica que nunca se toca, que é infinita, o cilindro, a cápsula, o círculo a circunferência e a elipse são todas consequências umas das outras, estas foram trabalhadas em residência nas suas diferentes dimensões superfícies e matérias.
A.B. Abreu
Ana Battaglia Abreu: A mais contínua de todas as formas por Carlos Alexandre Rodrigues
É na perspectiva do espectador que me proponho a este desafio, o de transcrever a minha experiência às instalações e trabalhos decorrentes da Residência Artística ATARAXIA. Estas, programadas num ciclo de 13 residências e posteriores exposições no Espaço Moinho e simultaneamente online.
O timing não permitiu que tivesse acompanhado o período de residência desta primeira exposição. Por este motivo será sempre ingrato para a artista e para as propostas que nos apresenta que este texto seja reflexo apenas do momento final, a exposição.
Ana Battaglia Abreu, para mim Margarida, apresenta: A mais contínua de todas as formas, título da exposição que podemos experienciar ao longo dos três pisos do antigo moinho. Não sendo totalmente desconhecido ao seu trabalho, tentei dentro da medida que me é possível, não estabelecer ideias pré-concebidas acerca da sua prática, ainda que temo que este exercício não seja fácil ou sequer possível.
Desenho em todas as formas
1.
Após nos ser revelada a primeira pista, o título da exposição: a mais contínua de todas as formas, somos imediatamente transportados para o campo da escultura. Não sei se por imposição do termo forma, ou porque realmente não consigo suprimir tudo o que conheço do trabalho que a Margarida nos tem vindo a apresentar.
Ao entrarmos no primeiro piso da exposição, um espaço cilíndrico e iluminado apenas com a luz de uma vídeo projecção, somos confrontados com uma instalação de fios/linhas. Estas, colocadas ao redor da sala no sentido seu cumprimento vertical, contornam e definem a altitude do espaço e delimitam o perímetro da circunferência, ou seja, que nos desenham tridimensionalmente a sala onde nos encontramos e que nos ajudam à compreensão do sentido deste lugar.
Sabido é que o desenho não necessita de grandes aparatos, é forma mais imediata da expressão humana, pode assumir diversas materializações, escalas e tipos. É geralmente um tipo de representação que pressupõe alguma inscrição por semelhança. Numa primeira análise, é um sistema imediato entre o cérebro e a mão.
Ainda que não tenha sido usado um comum riscador, ou sequer um suporte, proponho a hipótese que o que a Margarida nos apresenta vem do devir do desenho.
Este desenho, site-specific, contido dentro do seu suporte (sala expositiva), na sua aparente bidimensionalidade apresenta uma escala que transcende o desenho habitual, a escala da mão. Será a partir deste que encontramos a mão da Margarida.
2.
Na última sala encontramos um objecto que se agita no espaço. É acionado por uma ventoinha que faz oscilar a sua estrutura subtilmente, conferindo lhe assim um reforço visual da sua leveza na dinâmica espacial. É composto por fios/linhas que formam o seu contorno, como as que encontramos na instalação da primeira sala, e que nos permitem reconhecer as suas semelhanças.
A forma que pela repetição se torna agora familiar, é um cilindro que na sua materialização se conforma num esqueleto de uma forma geométrica, aqui apresentado com uma torção conferida pelo desencontro do eixo das suas bases, instalado horizontalmente no centro da sala.
Um cilindro translúcido, que dependendo da perspetiva de onde se posiciona o observador, tem a leitura de uma elipse. Pelas suas características formais e plásticas, este segundo desenho-objecto, permite estabelecer um paralelo imediato com o trabalho da primeira sala.
Considero que este último trabalho poderia ser entendido como o início das propostas da artista. O seu entendimento seria de uma maquete que tenderia a ser mimetizada a uma maior escala e que poderíamos observar na primeira sala, mas é muito mais que isso. Em última análise, mais interessante na sua vertente estética, isto é, pelo seu dinamismo, torção, suspensão e iluminação vem reforçar a minha anterior premissa neste limbo entre o desenho e o objecto, ou ainda que este objecto se materialize num desenho de si mesmo.
3.
Interessa ainda dizer, em forma de conclusão, que o resultado do que poderiam ser entendidos como uma série de exercícios a desenvolver em fase de residência, são na realidade um programa que a artista deixa em aberto de forma a continuar a sua investigação de lugares, formas, objetos, materiais e desenhos.
É no conjunto do trabalho exposto que a Margarida nos revela a sua capacidade inventiva, a sua mão e a sua leitura e eficácia transpositiva da leitura do real. Utilizando um jogo de escalas, materializações e manipulações consegue transportar-nos para dentro do seu fazer e pensamento e tornam as suas propostas tão desafiantes.
Caldas da Rainha, dezembro de 2020